Representante comercial e o vínculo empregatício
http://jus.com.br/revista/texto/20471
Publicado em 11/2011
SUMÁRIO: Introdução; 1. Contrato de trabalho 2. Representação comercial autônoma 3. Representação mercantil versus vínculo empregatício3.1 Empregado vendedor; 3.2 Fraude à legislação trabalhista; 4. Competência; 5. Conclusão; 6. Referências.
RESUMO: O alto custo de manter um empregado registrado nos conformes legais leva muitos dos empregadores a maquiar o contrato de emprego, camuflando o empregado vendedor como um representante comercial autônomo. Tal prática consiste em fraude contra o empregado, prejudicando-o junto a seus direitos trabalhistas. Para agravar a situação, uma linha tênue difere a figura do representante comercial autônomo e do vendedor empregado, pois a doutrina e a jurisprudência vêm encontrando dificuldades para achar um critério diferenciador. É preciso então um estudo mais com afinco do contrato de trabalho, com ênfase eu seu conceito, sem esquecer seus requisitos e elementos essenciais. Também é necessário que se compreenda melhor a figura do representante comercial autônomo, apurando as legislações que regulam esta matéria. O presente estudo tem por objetivo diferenciar as figuras do representante comercial autônomo do vendedor empregado e identificar os casos de fraude.
PALAVRAS-CHAVE: Representante comercial, vínculo de emprego, vínculo empregatício, fraude à legislação trabalhista.
ABSTRACT: The high costs to maintain a registered employee in the legal conforms take a lot of the employers to manipulate the work contract, camouflaging the sales employee as an autonomous commercial representative. This practice is a fraud against the employee, damaging it, considering its labor rights. To aggravate the situation, a tenuous line differ the figure of the autonomous commercial representative from the sales employee, because the doctrine and the jurisprudence have been having difficulties to find a differentiator criterion. Then, it is necessary to study harder the work contract, giving emphasis in its concept, without forgetting its essential requirements and elements. It is also important to understand better the figure of the autonomous commercial representative investigating the laws that regulate this subject. The objective of this study is to differentiate the figures of the autonomous commercial representative from the sales employee and to identify the fraud cases.
KEYWORDS: Representative trade, bond of employment, labor law fraud.
INTRODUÇÃO
A lei nº 4.886 de 1965 e o Código Civil de 2002 regulam as atividades dos representantes comerciais autônomos. O representante comercial, também chamado de agente, possui um contrato de representação comercial ou um contrato de agência com a empresa que ele representa e teoricamente não tem vinculo empregatício.
Porém, já existem decisões que reconhecem a relação de emprego do representante comercial, quando este é submetido à subordinação e ausência de autonomia.
Acontece que muitas empresas usam de empregados na forma de representantes comerciais para fraudar a legislação trabalhista e não pagar aos seus trabalhadores os direitos que lhes são devidos.
É nesse prisma que o presente trabalho abordará as figuras jurídicas da relação de emprego e da representação comercial, em linhas gerais assim: a sua origem, sua evolução no tempo, sua repercussão nas relações jurídicas, traçando um paralelo até mesmo com a doutrina e a jurisprudência.
Devem ser analisados os fatos, a realidade, obedecendo ao princípio da primazia da realidade, sem prejuízo de outros princípios do Direito do Trabalho, para se detectar realmente se a relação jurídica comporta a presença de um representante comercial autônomo ou se trata de fraude na relação de emprego.
Em virtude dessas considerações elencadas acima, buscar-se-á com presente pesquisa, os atuais conflitos enfrentados pelos operadores do direito, bem como conhecer as formas de soluções, às opiniões divergentes sobre o tema, trazendo, principalmente, a legislação pátria, a jurisprudência dominante, assim como, a busca para melhor resolver a discussão suscitada.
A importância da pesquisa sobre o assunto se dá em virtude de conhecer e diferenciar as situações em que se trata de contrato de agência ou de representação comercial autônoma ou fraude do vínculo empregatício.
1. CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO
O contrato individual de trabalho está topologicamente situado no âmbito do Direito Individual do Trabalho. Portanto não está na órbita do Direito Coletivo do Trabalho, que estuda as relações coletivas laborais.
O doutrinador Renato Saraiva [01] assim o conceitua:
Não basta apenas conceituar o contrato de trabalho, até porque a própria Consolidação de Leis Trabalhistas o define. Para fim desse estudo é importante entender e decompor os elementos do conceito.
Como foi dito, a própria CLT [02] no artigo 442, define o contrato individual de trabalho ao dispor "Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego". Porém a doutrina critica esse conceito dado pela CLT, como podemos citar Maurício Godinho Delgado [03]:
Uma ressalva interessante é a nomenclatura contrato de trabalho ser incorreta, já que a terminologia correta seria contrato de emprego, pois o termo trabalho é bem mais amplo, podendo tratar de qualquer tipo de trabalhador, o autônomo, avulso, empregado, etc. Porém, pelo fato do constante uso e pela lei assim usar, o termo contrato de trabalho se consagrou como a terminologia usada.
O doutrinador Sérgio Pinto Martins [04] não se limita a conceituar contrato de trabalho, ele explica que:
Os requisitos são: prestação trabalho realizado por pessoa física, pessoalidade, subordinação, onerosidade, continuidade e, por fim, alteridade. O requisito de alteridade é trazido por Sérgio Pinto Martins [05].
Como ensina o professor Maurício Godinho Delgado [06] a figura do trabalhador deve ser sempre uma pessoa física (ou natural), dado que a prestação de serviço por uma pessoa jurídica não caracteriza uma relação de emprego, e sim um contrato de prestação de serviços.
Relevante para este estudo é o que o professor Maurício Godinho Delgado [07] ensina:
Em uma relação concreta, o contrato de prestação de serviços de uma pessoa jurídica pode mascarar uma relação de emprego.
Alguns autores não trazem pessoa física como requisito da relação de emprego.
Sérgio Pinto Martins [08] diz que:
Porém, há casos que em o trabalhador pode ser substituído sem afastar a pessoalidade da relação de emprego. Por exemplo, férias, licença gestante e outros casos. Deve ficar expresso o ensinamento de Maurício Godinho Delgado [09] que "a pessoalidade é elemento que incide apenas sobre a figura do empregado". Podendo haver a substituição do empregador.
Sérgio Pinto Martins [10] deixa claro que "o trabalho deve ser prestado com continuidade. Aquele que presta serviços eventualmente não é empregado".
Renato Saraiva [11] considera "o trabalho não eventual contínuo, duradouro, permanente, em que o empregado, em regra, se integra aos fins sociais desenvolvidos pela empresa".
O contrato de trabalho é oneroso. O empregado recebe, em contraprestação pelos serviços prestados, o salário.
O salário, segundo os artigos 458 da CLT [12], pode ser pago na sua totalidade em dinheiro, ou parte em dinheiro e o resto em utilidades, e segundo o artigo seguinte da mesma Lei, pode ser pago por mês, quinzena, semana ou por dia.
Motivado pelo salário, o empregado usa de sua força para trabalhar em disposição do empregador. A prestação de serviços não se presume gratuita. O contrato de emprego é sempre oneroso. Salvo os casos de trabalho voluntário.
Outro requisito da relação de emprego, talvez o mais importante para este estudo, é a subordinação, nas palavras de Maurício Godinho Delgado [13], "entre todos os elementos, o que ganha maior proeminência na conformação do tipo legal da relação empregatícia".
Como nos coloca Renato Saraiva [14], "o empregado é subordinado ao empregador" de forma jurídica, advinda da relação jurídica estabelecida no contrato de emprego, cabendo ao obreiro "acatar as ordens e determinações emanadas", podendo o empregador aplicar sanções "em caso de cometimento de falta ou descumprimento das ordens emitidas".
Sérgio Pinto Martins [15] ensina sobre subordinação:
Maurício Godinho Delgado [16] traz excelentes observações, para este estudo:
Ainda, aproveitados os ensinamentos de Maurício Godinho Delgado [17], a subordinação "atua sobre o modo de realização da prestação e não sobre a pessoa do trabalhador".
Amauri Mascaro Nascimento [18] mostra exemplos no caso concreto para a conclusão:
A alteridade, ou princípio da alteridade, assim como o requisito da pessoa física, não é unânime entre os doutrinadores como requisitos da relação de emprego.
Os riscos da atividade econômica exercida pelo empregador cabem apenas a ele, como expressa Renato Saraiva [19]:
Sérgio Pinto Martins [20] é mais objetivo e fala que "o empregado pode participar dos lucros da empresa, mas não dos prejuízos".
São elementos essenciais ao contrato de emprego são aqueles dispostos no Código Civil de 2002 [21], no artigo 104 que validam o negócio jurídico.
Além de o agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei, é necessário a manifestação da vontade expressa ou tácita.
Renato Saraiva [22] manifesta seu entendimento em um ponto importante quanto ao agente capaz:
Quanto à licitude do objeto, Maurício Godinho Delgado [23] diz que não será válido contrato laborativo que tenha por objeto trabalho ilícito. Este mesmo autor [24] ainda traz a diferença entre trabalho irregular ou trabalho proibido e trabalho ilícito:
Quanto à forma, Sérgio Pinto Martins [25], suscita que "o contrato de trabalho não tem necessariamente uma forma para ser realizado". Basta haver ajuste entre as partes, o contrato pode ser feito até verbalmente.
Em última análise, mesmo o contrato de trabalho não tendo as solenidades necessárias, sendo ele aceito até mesmo verbalmente, o que na verdade é necessário é da vontade e aceitação das partes.
2. REPRESENTAÇÃO COMERCIAL
O novo Código Civil de 2002, em seu capitulo XII, ajuda a regular sobre o contrato de agência, sendo compatível com a Lei 4.886 de 04 de dezembro de 1965, com alterações pela lei 8.420/92, que rege a atividade dos representantes comercias autônomos.
O artigo 1º da Lei 4.886/65 [26] define o que é representação comercial:
Fábio Ulhoa Coelho [27] conceitua o contrato de representante comercial:
Fábio Ulhoa Coelho [28] ainda sustenta que o nome representante comercial não é o mais adequado, sendo melhor chamar de "agência". Rubens Requião [29] sustenta que o representante comercial ou agente é comerciante.
Maurício Godinho Delgado [30] explica sobre o representante comercial, ao falar que "ele próprio provoca a ocorrência dos atos jurídicos, dos quais pode em seguida participar".
Rubens Requião [31] disciplina sobre a remuneração do representante comercial:
Recebe a remuneração proporcionalmente aos negócios feitos e após a sua conclusão.
O representante comercial autônomo é aquele que assume a obrigação de promover negócios, por conta de outrem, em zona específica, em caráter não eventual e sem vínculos de dependência.
Como ensinam Marcelo Bertoldi e Márcia Carla Pereira Ribeiro [32]:
A rescisão contratual do representante comercial, pelo representado é expressa na Lei 4.886/65 [33] em seu artigo 35.
Nestes casos o representado fica livre do encargo de indenizar o seu representante, de acordo com Fábio Ulhoa Coelho [34].
Já o representante comercial pode rescindir o contrato pelos seguintes motivos, expostos no Artigo 36 da Lei 4.886/65 [35].
Nessas hipóteses elencadas no artigo supra citado, com exceção da força maior, caberá indenização legal e ao aviso prévio ao representante, como ensina Rubens Requião [36],
À guisa de exemplo convém citar Ricardo Nacim Saad [37]:
O representante comercial atua na mediação do comercio, com uma função de servir o tráfico mercantil.
3. REPRESENTAÇÃO MERCANTIL VERSUS CONTRATO EMPREGATÍCIO
Primeiramente vale ressaltar que há diferenças entre contrato de trabalho e contrato de representação comercial. E por meio das doutrinas e jurisprudências é que se tem o norte para poder distinguir em qual instituto se encaixa o profissional.
Fábio Ulhoa Coelho [38] faz as seguintes considerações:
A representação comercial autônoma muitas vezes e incorretamente tomada como uma espécie de contrato de trabalho. O primeiro projeto de lei dedicado ao instituto que logrou aprovação das duas Casas legislativas, no Brasil, foi inteiramente vetado pelo Presidente da República Castello Branco, por assemelhar em demasia a representação ao regime trabalhista dos vendedores, viajantes e pracistas, estabelecendo uma equiparação entre representante autônomo e assalariados considerada "incabível" pelas razoes do veto. Ainda hoje, há advogados e magistrados que se valem de princípios do direito do trabalho, em especial o da tutela do hipossuficiente, no equacionamento de questões relacionadas ao representante, concluindo por distorcidos pleitos e decisões.
Frente à caracterização de qual profissional se trata no caso concreto, será considerada a espécie de relação jurídica a que foi submetido, se subordinada, ou não, bem como os direitos decorrentes da relação.
Na obra de Rubens Requião (p.56/57) o mesmo registra critérios distintivos entre o contrato de trabalho e o contrato de representação comercial, in verbis:
a) No contrato de representação comercial o agente presta serviço através de sua própria organização, enquanto no contrato de trabalho o empregado se apóia na organização patronal.
b) O agente autônomo destina o resultado econômico de seu trabalho ao seu proveito próprio, enquanto no contrato de trabalho o empregado o destina a favor exclusivo da empresa patronal.
c)O agente autônomo corre os riscos de sua atividade econômica. O empregado nada tem a ver com o resultado econômico de seu trabalho. Por isso, a comissão, provindo do agente, depende do resultado útil de sua atividade, ao passo que o empregado tem direito ao salário independentemente do resultado lucrativo ou não de seu trabalho.
d) A esses critérios teórico-cientificos podemos acrescer, exteriorizando o elemento da autonomia, os seguintes fatos que induzem a existência da atividade não subordinada:
1º) Liberdade de itinerário nas visitas à clientela;
2º) liberdade de emprego do tempo;
3º) ônus pessoal das despesas de sua organização (manutenção do escritório próprio);
4º) inscrição nos registros peculiares;
5º) pagamento dos impostos e taxas pelo exercício da atividade.
Mesmo com os critérios distintivos apresentados, o mesmo autor ressalta que somente o juiz, no caso concreto é que poderá precisar a ocorrência de uma ou outra espécie de relação jurídica.
A diferença da relação jurídica pactuada servirá como diretriz para julgamento dos direitos legais decorrentes do pacto firmado.
Além do elemento autonomia, o elemento pessoalidade da relação de emprego também é uma característica que em determinados casos e pode, então, diferenciar o representante comercial do vendedor empregado, já que como ensinou Maurício Godinho Delgado, nesta última citação vista, algumas vezes não é o próprio representante comercial que faz sua tarefa, delegando a algum outro colaborador fazer.
Noutro ponto que o mesmo doutrinador [39] difere o contrato de agência para do contrato empregatício é na característica de subordinação:
Há certos traços concretos que tende a caracterizar a subordinação, isto é, a concentração no tomador da direção central e cotidiana da prestação de serviços efetivada pelo obreiro. Em situações fronteiriças, quanto mais global for a reunião desse traços, mais inequívoca será a presença de uma relação de subordinação entre as partes. Despontando apenas um ou outro de tais traços, deverá o operador jurídico aferir, no conjunto dos demais elementos do vínculo sociojurídico existente, a tendência preponderante conferida à relação pactuada (seja a tendência pela subordinação, seja a tendência pela autonomia).
Sendo a subordinação um importante elemento do contrato de trabalho, ela o diferencia do contrato de agência. A subordinação do representado com o representante é bem mais limitada que o a subordinação do empregador e empregado. O representado não pode definir como o representante vai fazer o seu trabalho, a ordem, o horário, com que material e outras limitações que o empregador pode determinar a seu empregado.
3.1 Empregado vendedor
Muitas vezes, os empregados vendedores, exatamente por possuírem maior autonomia em seu trabalho, são rotulados como representantes comerciais, por isso que convém fazer breve abordagem sobre eles.
A Lei 3.207 [40] de 18 de julho de 1957, sancionada pelo presidente Juscelino Kubitschek, é uma lei trabalhista especial que surgiu para regular a situação do vendedor empregado.
Além desta Lei alguns artigos da CLT também ajudam a regular pontos relevantes como a remuneração e a comissão.
Maurício Godinho Delgado [41] explica:
É importante ressaltar que a Lei 4.886/65 e tampouco o Código Civil de 2002 em seu no Capitulo de Contrato de agência e distribuição, não se aplicam ao empregado vendedor.
Ponto preponderante relativo ao vendedor empregado é sua remuneração, em regra, integra ao salário fixo do obreiro, a comissão é muito usada, sendo concedida de acordo com o percentual vendido. Como garante o Artigo 7º, VII da Constituição Federal de 1988 [42] o salário nunca pode ser inferior ao mínimo, aplicável para aqueles que recebem remuneração variável, sendo o caso do empregado vendedor.
Como observa Maurício Godinho Delgado [43]:
Quanto ao risco concernente às vendas, o princípio da alteridade estabelece que permaneça a ônus do empregador os riscos relativos aos negócios efetuados. Entretanto o Artigo 7º da Lei 3.207/57 [44] diz que "verificada a insolvência do comprador, cabe ao empregador o direito de estornar a comissão que houver pago".
Maurício Godinho Delgado [45] doutrina sobre o assunto:
O mesmo doutrinador também leciona sobre a cláusula "Star del credere":
Delgado [46] ainda afirma que esta cláusula já não é mais usada, devido ao grande risco que assumiria o trabalhador à sua prestação alimentícia salarial. Até que a Lei 8.420/92 proibiu expressamente a cláusula star del credere até mesmo para representantes comerciais.
Amauri Mascaro Nascimento [47] diferencia o vendedor empregado do representante comercial:
É oportuno assinalar agora que o empregado vendedor que realiza atividade externa não tem direito a receber horas extras, em tese, de acordo com o artigo 62 da CLT [48]:
Assim clarifica Valentin Carrion [49]:
É claro que se a jornada for fiscalizada, ainda que indiretamente, ele terá direito às horas extras.
O empregado vendedor, apesar de também auxiliar atividade mercantil, mediando o comércio, ele não tem poder de direção, é dotado de subordinação.
3.2 Fraude contra a legislação trabalhista
O que ocorre frequentemente é a fraude na contratação de profissionais como representante comercial com o intuito de fraudar direitos trabalhistas, negociação vedada expressamente pelo artigo 9º da CLT [50].
Havendo fraude no contrato civil de representação comercial poderá ser descaracterizada a modalidade que foi ajustada no pacto, com base no principio da primazia da realidade, levando o legislador a aplicar o contrato de trabalho previsto na Consolidação das Leis do Trabalho.
Alice Monteiro de Barros [51] manifesta seu entendimento sobre o princípio da primazia da realidade:
A própria CLT [52] em seu artigo 9º estatui que:
A jurisprudência refere como marco essencial para essa descaracterização se vincula nas provas juntadas aos autos da ação judicial. Os elementos que se vincula o legislador estão previstos nos artigos 1º e 2º da Lei nº 4866/65 e no artigo 3º da CLT, em especial a subordinação jurídica, elemento que apresenta como essencial para a diferenciação do tipo de contrato que foi pactuado.
O Tribunal Superior do Trabalho [53] enfatiza que a presença dos pressupostos do art. 3º da CLT são condições para caracterizar o contrato de trabalho, in verbis:
O entendimento da 5ª. TURMA do Tribunal Regional do Trabalho do 9ª Região [54], de forma mais detalhada estabelece:
Desta forma, se não for comprovada a presença dos requisitos exigidos pelo artigo 3º, da CLT [55], em especial a subordinação, não há como ser declarada a existência de vínculo empregatício entre as partes.
Porém, a 3ª turma [56] deste mesmo Tribunal decidiu de forma contraria ao elemento caracterizador do vinculo empregatício ao assim afirmar:
Porém, o critério largamente adotado para dirimir tal questão está na decisão em que a fundamentação é baseada no principio da primazia da realidade, formalizada na decisão da 3ª Turma do mesmo tribunal [57], que assim dispõe:
Outro elemento dentro os requisitos para ser empregado que tem bastante destaque no julgamento das fraudes ocorridas no contrato de trabalho, para, assim, evitar as responsabilidades trabalhistas esta no requisito da pessoalidade que é exigido no contrato de trabalho.
Muitas vezes o empregador exige que seu empregado crie uma pessoa jurídica na forma da lei de representação comercial, para assim fraudar os direitos trabalhistas.
Outro princípio que vem nas jurisprudências para a diferenciação do tipo de pacto laborado se dá no principio da alteridade, que segundo ensina Renato Saraiva: "o risco da atividade econômica pertencem única e exclusivamente ao empregador".
Portanto, se o trabalhador assume os riscos da atividade econômica, sua relação será de representante comercial, se ao contrário, o risco foi assumido pelo contratante, a relação apresentada será de emprego.
O Tribunal Regional do Trabalho 9ª Região [58] também já manifestou sobre o assunto da seguinte forma:
Rubens Edmundo Requião [59] estabelece que o marco principal para distinguir esteja na autonomia do representante comercial, estabelecendo critérios fáticos ensejadores de descaracterizar o contrato de representação comercial, o que está ligado à independência do profissional, na qual pode ser destacado:
Portanto, para se reconhecer a existência de fraude na relação contratual das partes é importante examinar todo o conjunto probatório, porque o contrato de trabalho, segundo Rubens Edmundo Requião [60], na mesma obra, o caracteriza como contrato-fato, bastando que se verifiquem os requisitos de: prestação de trabalho não eventual, em regime de subordinação e mediante salário.
Realmente, o contrato de trabalho é do tipo realidade, por isso, indispensável examinar as circunstâncias fáticas em que se deu a relação jurídica, sobrepondo-as aos documentos, muitas vezes maldosamente utilizados para travestir uma representação comercial.
4. COMPETÊNCIA
Em rápidas pinceladas, é oportuno tratar sobre a competência material de exercer a jurisdição, se trata de empregado vendedor ou de um representante comercial. ‘
A Emenda Constitucional n. 45/04, alterou o artigo 114 da Constituição Federal [61], introduzindo temas que eram da competência da Justiça Comum estadual na competência da Justiça do Trabalho.
Isto trouxe para a Justiça do Trabalho, atividades que não configuram relação de emprego, mas configuram relação de trabalho, por ausência de requisitos do artigo 3º da CLT [62], inclusive atividades exercidas pelo representante comercial autônomo.
O grande problema que trouxe essa Emenda Constitucional é a interpretação ampla para relação de trabalho, como explica Rodrigo Ribeiro Bueno [63]:
Contudo, uma interpretação restritiva da expressão "relação de trabalho", como equivalente a "relação de emprego", iria na contramão da quase unanimidade da doutrina juslaborista nacional, que enxerga nítida distinção entre "relação de trabalho" (gênero) e "relação de emprego" (espécie).
Mais uma vez aqui ganha relevância qual seria a competência para as ações que envolvam representantes comerciais autônomos.
Rodrigo Ribeiro Bueno [64] diz que:
Como citado, há de se verificar os elementos estudados, como requisitos do contrato de trabalho, ao menos três desses elementos. Embora se o representante comercial autônomo for uma falsa pessoa jurídica, baseado no princípio da primazia da realidade, a competência será da Justiça do Trabalho, porém se for uma pessoa jurídica verdadeira a competência será da Justiça Comum estadual.
Em síntese, a competência material, em grande parte dos casos, pertence à Justiça do Trabalho. Esta que é a competente para julgar as relações de trabalho.
A competência material da justiça comum será inquestionada se o representante comercial autônomo for organizado através de empresa e cobrar suas comissões de outra empresa.
5. CONCLUSÃO
A pesquisa envolveu olhares principalmente na Consolidação das Leis do Trabalho, na Constituição Federal de 1988, no Código Civil de 2002, na Lei 4886 de 1965. Sem desprezar outras legislações que também contribuíram, porém de forma não tão relevante quanto tais leis citadas.
O elevado custo de manter um empregado registrado com todos os direitos previstos na CLT, somadas as contribuições previdenciárias, leva muito dos empregadores contarem com falsos representantes comerciais para os auxiliarem na pratica mercantil, contando na verdade com empregados vendedores.
Este ato de fazer com que um empregado vendedor atue como representante comercial autônomo é uma fraude contra as leis trabalhistas, podendo o contrato de representação ser descaracterizado, transformando-se em contrato de trabalho.
A doutrina e a jurisprudência acham uma tarefa difícil em conseguir um critério diferenciador entre as figuras do representante comercial autônomo do empregado vendedor.
Tal dificuldade se dá, porque são figuras irmãs, muito próximas, diferidas por uma linha tênue. O principal ponto de distinção é que o empregado vendedor não tem autonomia, ele é subordinado ao seu empregador. Não tendo poder de direção.
O representante comercial autônomo não é dotado deste elemento essencial que é a subordinação. Ele tem poder de direção, pode escolher como e de que forma vai executar suas tarefas, quais marcas usar, qual horário começará seus negócios e a ordem que vai escolher. Já o empregado vendedor, tudo isso é determinado por seu empregador. Quanto maior a autonomia, mais representante comercial e menos vendedor empregado ele vai ser.
Muitas vezes pode ser que o contrato de representação comercial autônoma seja mais vantajoso. Mas na maioria dos casos, o empregador obriga com que seu empregado vendedor aceite dissimular seu contrato de emprego para fim de ficar livre dos encargos trabalhistas. O trabalhador, parte hipossuficiente, acaba obrigado e iludido que irá ter vantagens e se submete a tal fraude.
Em um contexto de proteção aos direitos fundamentais, direito social do trabalho, fundamentos da república garantidos pela Carta Magna. O judiciário tem o poder de conferir a esse trabalhador regras que trazem a eles maior nível de proteção, regras que estão previstas na Consolidação das Leis do Trabalho, e não na Lei 4886 de 1965 que trata da representação comercial.
Aceitar a camuflagem da representação comercial para maquiar um contrato de emprego afronta o artigo 9º da CLT assim como afronta a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho, ambos previstos no artigo primeiro da Constituição Federal.
6. REFERÊNCIAS CONSULTADAS
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BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 5. ed. São Paulo: Rt, 2009.
______. Constituição, 1988.
______, Decreto-Lei n.º 5.452, Consolidação das Leis do Trabalho, de 1º de maio de 1943.
______, Lei 4886, de 09 de dezembro de 1965.
______. Lei 3.207 de 18 de julho de 1957
______, Lei 10.406/2002, Código Civil, de 10 de janeiro de 2002.
______,TRIBUNAL DE REGIONAL DO TRABALHO NONA REGIÃO: banco de dados. Disponível em: Acesso em 20 de agosto de 2011>.
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Notas
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- DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: Ltr, 200, pág. 291
- MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2005, pág. 94
- DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: Ltr, 200, pág. 293
- MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2005, pág. 93
- SARAIVA, Remato. Direito do trabalho. 7. ed. São Paulo: Método, 2008. (Concursos públicos), pág. 43
- BRASIL, Decreto-Lei n.º 5.452, Consolidação das Leis do Trabalho, de 1º de maio de 1943.
- DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: Ltr, 200, pág. 301
- SARAIVA, Remato. Direito do trabalho. 7. ed. São Paulo: Método, 2008. (Concursos públicos), pág. 43 e 44.
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- DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: Ltr, 200, pág. 302
- DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: Ltr, 200, pág. 303
- NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito do trabalho. 31. ed. São Paulo: Ltr, 2005, pág. 188
- SARAIVA, Remato. Direito do trabalho. 7. ed. São Paulo: Método, 2008. (Concursos públicos), pág. 44.
- MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2005, pág. 94.
- BRASIL, Lei 10.406/2002, Código Civil, de 10 de janeiro de 2002.
- SARAIVA, Remato. Direito do trabalho. 7. ed. São Paulo: Método, 2008. (Concursos públicos), pág. 75
- DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: Ltr, 200, pág. 501.
- DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: Ltr, 200, pág. Página 501
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Informações sobre o texto
Orientadora: Fabíola Cristina Carrero - Docente da instituição Faculdade de Apucarana.
Como citar este texto: NBR 6023:2002 ABNT
ANDERSON, Rafael Simões. Representante comercial e o vínculo empregatício. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3064, 21 nov. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/20471>. Acesso em: 21 dez. 2011.